Corria o ano de 1857 quando o escritor brasileiro
José de Alencar publicou o romance
O Guarani, cuja trama se desenrola em torno do romance proibido entre a aristocrata portuguesa Cecília de Mariz e o índio Peri, da
tribo guarani. Inspirada neste romance, estreava-se em 1870 no
Teatro alla Scala, em Milão, a ópera-ballet
Il Guarany, assinada pelo também brasileiro
António Carlos Gomes.
Estamos em 1933 e a cidade do Porto assiste a um autêntico surto de cafés, alguns dos quais surgem em plena
Avenida dos Aliados. Entre os mais ilustres conta-se sem dúvida o Guarany, “o perfume indígena da Amazónia bem no coração do Porto”, situado nos números 85 a 89 da Avenida. Remodelado pelo arquitecto
Rogério de Azevedo, com um alto-relevo do escultor
Henrique Moreira, o Guarany tornou-se prontamente no local de eleição para músicos, intelectuais e ilustres homens de negócios. Além de um restaurante—mais tarde convertido em salão de bilhar— e de uma belíssima orquestra residente, conta-se que foi o primeiro a usufruir de arcas frigoríficas e de um inovador sistema de refrigeração e aquecimento, hoje considerado um antepassado longínquo do ar condicionado.
Já de si rica, a história do café-restaurante Guarany viu-se, porém, no fim do século XX, vinculada a uma nova história fascinante: à semelhança de outros estabelecimentos prestigiados do Porto — como o
café Majestic, o
Hotel Aliados, o
Hotel Internacional, o
Hotel Pão de Açúcar ou o
Hotel Vera Cruz — a história do Guarany não pode hoje em dia ser contada senão à luz do notável percurso de vida da família Barrias.
Impulsionado pela situação em que se provavelmente se encontraria após a morte do seu pai aos 4 anos de idade, da sua mãe aos 8 e da sua irmã aos 12 —com quem passara a viver— Agostinho Barrias acabou por cruzar o oceano em busca de pastos mais verdes, tendo-se estabelecido no Brasil, onde se dedicou sobretudo à restauração. De regresso a Portugal, o sucesso de vários empreendimentos na área —como é o caso dos cafés Ofir, Itália, Padrão ou Imperador, entre outros— permitiu-lhe finalmente dedicar-se a uma paixão que cultivava já desde cedo: a paixão pelos cafés históricos.
Em 1982, Agostinho Barrias adquire assim o Guarany com o objectivo de devolver ao mítico café a sua antiga glória. Apoiado pelo filho Fernando, restaura-o finalmente entre 2001 e 2003, introduzindo-se também dois novos painéis da pintora
Graça Morais, intitulados “Os Senhores da Amazónia”. A tradição e os traços históricos aliam-se assim às comodidades modernas e a um serviço de excelência, que recuperaram para o Guarany o tão merecido estatuto de café de referência —histórica, artística, arquitectónica e cultural— de que hoje desfruta.
A continuação desta história no Hotel Aliados →